domingo, 7 de fevereiro de 2010

escentes têm direito a sexualidade segura

Os jovens necessitam de orientação para desfrutar a sexualidade com segurança e de forma saudável. Quanto mais informados, melhor será a vivência dessa sexualidade, sem culpas e com prevenção
Por Denise de Quadros
Estudo recente da Organização Mundial da Saúde (OMS) revela que 22% dos adolescentes iniciam a atividade sexual aos 15 anos de idade. A informação consta na Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2009, divulgada em dezembro do ano passado. O mesmo estudo apontou que a iniciação sexual precoce está associada ao não uso, ou uso inadequado de preservativos e suas consequências (gravidez precoce, DST/Aids). A precocidade no início das relações sexuais dos adolescentes levanta a seguinte reflexão: Até que ponto pais e professores estão preparados para discutir questões relativas à sexualidade com os filhos e alunos?
Dados da PeNSE 2009 mostram que 30,5% dos estudantes já tiveram relação sexual alguma vez. A porcentagem do sexo masculino foi de 43,7% frente aos 18,7% do sexo feminino (para o conjunto das capitais e o Distrito Federal). Nas escolas públicas foram constatados mais alunos que já iniciaram a sua vida sexual (33,1%) comparados aos das escolas privadas (20,8%). Ratificando as diferenças entre o comportamento sexual de meninos e meninas, a Pesquisa sobre Comportamento, Atitudes e Práticas Relacionadas às DSTs e Aids (PCAP-2008) do Ministério da Saúde, também divulgada em dezembro de 2009, detecta que a vida sexual deles começa mais cedo – 36,9% tiveram relações sexuais antes dos 15 anos. Já entre as meninas, esse índice cai para menos da metade (17%).
Risco de contaminação - Quanto à prevalência de DSTs entre adolescentes não há informações, mas sabe-se que o número de casos notificados está bem abaixo dos números reais. Na esfera social, os baixos níveis escolar e socioeconômico estão associados a essas doenças.
No que diz respeito à infecção pelo HIV, os dados que integram o relatório do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids), divulgado em novembro de 2009, mostram que a tendência de contaminação de mulheres e pessoas cada vez mais jovens pelo vírus é mundial. Crianças e adolescentes com menos de 15 anos somam 2,1 milhões de infectados. Em 2008, 430 mil pessoas nessa faixa etária foram contaminadas e o número de mortes de crianças e adolescentes em consequência da doença chegou a 280 mil. No Brasil, a grande preocupação do Departamento de Doenças Sexualmente Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde são as meninas entre treze e 19 anos.
As adolescentes e jovens brasileiras são mais vulneráveis ao contágio da Aids que os meninos de igual faixa etária. Segundo o último Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde, divulgado em novembro de 2009, foram registrados mais casos da doença nas meninas entre treze e 19 anos em relação aos meninos, desde 1998. Atualmente, a cada oito meninos infectados existem dez casos de meninas. Antes, a proporção era de dez mulheres para cada grupo de 15 homens.
Uso de Preservativo - Segundo a PCAP-2008, a população brasileira possui um elevado índice de conhecimento sobre as formas de infecção e de prevenção da Aids – mais de 95% da população sabe que o uso do preservativo é a melhor maneira de evitar a infecção pelo HIV. Esse é um dos índices mais elevados do mundo. Pesquisa realizada em 64 países indicou que 40% dos homens e 38% das mulheres de 15 a 24 anos têm conhecimento exato sobre como evitar a transmissão do HIV.
Entretanto, apesar do elevado conhecimento, depois da primeira relação sexual, o uso da camisinha cai. Passa de 61% para 50% nas relações sexuais com parceiros casuais. Na avaliação da Assessora Técnica do Departamento de DST e Aids do Ministério da Saúde, Nara Vieira, os jovens de hoje nasceram na era da Aids, por isso a relação com o preservativo é mais habitual. “O problema é que, quando se estabelece a confiança entre eles e o relacionamento fica estável, o uso do preservativo deixa de ser prioridade, em especial, para as meninas”, diz. Para ela é preciso incentivar a negociação do uso do preservativo entre os parceiros. “Muitos adolescentes ainda não estão dialogando de forma correta e nem pensando sobre a prevenção e suas implicações”, afirma.
Para o psicólogo e professor do Projeto Afetivo Sexual, que atende alunos do 6º ano (antiga 5ª série) até o 3º ano no Distrito Federal, Erich Botelho, os jovens precisam entender que o coquetel para a Aids mudou o perfil da doença, mas que a cura ainda não existe.
Pesquisa feito pelo Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (NESA/Uerj) para identificar fatores de risco às DSTs na adolescência mostrou que entre as justificativas para o não uso do preservativo estão: esquecimento, custos e desprazer na relação sexual.
Para os pesquisadores um caminho eficaz para inserir o uso do preservativo talvez seja associar a camisinha ao prazer resultante da segurança que ela proporciona. Não usá-la significa correr riscos de engravidar sem querer e/ou sem poder, de ficar doente ou até morrer. Ao mesmo tempo, dizem que não se pode abandonar outras medidas de redução do risco de contaminação por DST/Aids igualmente importantes como: orientações sobre o início da vida sexual, fidelidade mútua, redução do número de parceiros e abandono de práticas sexuais de risco. Erich Botelho acredita que investir na capacitação de jovens formando adolescentes multiplicadores pode ser uma saída eficaz. Boa propaganda e mídia mais formatada por jovens também colaboram.
Prevenção nas Escolas - Os dados da PeNSE 2009 mostram que 87,5% dos estudantes da rede pública e 89,4% da rede privada receberam informações sobre Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis. Quanto à orientação sobre prevenção de gravidez, 82,1% dos alunos das escolas privadas e 81,1% das públicas, no total das capitais brasileiras e Distrito Federal, receberam informações sobre o tema na escola. A pesquisa revela, ainda, que 71,4% dos estudantes da rede pública e 65,4% da rede privada, tiveram informações sobre a aquisição gratuita de preservativos.
Em 2003, os Ministérios da Saúde e da Educação, em parceria com escritórios das Nações Unidas, implantaram o Programa Saúde e Prevenção nas Escolas, que discute prevenção das DSTs e Aids, saúde sexual e reprodutiva. A iniciativa – presente em mais de 50 mil escolas públicas de todo o país – também disponibiliza preservativo à comunidade escolar. “O jovem está aberto, preocupado com sua saúde. E a escola é um espaço adequado para que os estudantes se conscientizem sobre a importância do uso da camisinha e a prevenção das DSTs”, pontua Nara.
A técnica ressalta a importância do diagnóstico para HIV (30,4% dos jovens entre 15 e 24 anos já fizeram o teste). “Existe uma grande preocupação em incentivar a procura para o diagnóstico”, diz. Pensando nisso, o Programa Saúde e Prevenção nas Escolas criou um questionário que é aplicado junto aos adolescentes. Nele o jovem é incentivado a refletir sobre a vulnerabilidade ao HIV e a procurar postos de saúde caso deseje fazer o teste. No Brasil, cerca de 255 mil pessoas desconhecem a sorologia.
Gravidez precoce – Outro ponto importante que envolve a questão da sexualidade na adolescência diz respeito à gravidez. A OMS considera a gravidez precoce um problema médico-social grave e de alto risco para saúde das jovens.
Especialistas advertem que entre os principais riscos estão: a maior incidência de partos prematuros e recém-nascidos de baixo peso e a incidência de doenças venéreas. Além disso, a gravidez na adolescência envolve muito mais que problemas físicos, traz também problemas emocionais e sociais. A grande maioria das meninas não tem condições financeiras nem emocionais para assumir a maternidade e, por causa da repressão familiar, muitas fogem de casa. De acordo com a pesquisa “Juventudes Brasileiras”, realizada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), a evasão escolar é uma das consequências imediatas da gravidez na adolescência: 25% das garotas que engravidam abandonam a escola.
A Pesquisa Nacional em Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS 1996) - realizada a cada dez anos – já mostrava um dado alarmante: 14% das adolescentes brasileiras já tinham pelo menos um filho e as jovens mais pobres apresentavam fecundidade dez vezes maior. Entre as garotas grávidas atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no período de 1993 a 1998, houve aumento de 31% dos casos de meninas com idade entre dez e 14 anos. Nesse mesmo período, 50 mil adolescentes foram parar nos hospitais públicos devido a complicações de abortos clandestinos.
Sexo em casa e na escola ainda é tabu?A adolescência é uma etapa da vida na qual a personalidade está em fase final de estruturação e a sexualidade se insere nesse processo, sobretudo, como elemento determinante da identidade. Nos tempos modernos, o sexo tornou-se um dos assuntos mais discutidos, mesmo assim, muitos pais ainda enfrentam dificuldades para abordar o tema junto aos filhos. Segundo o psicólogo e professor Erich Botelho, a sexualidade representa  muito mais do que o ato sexual. Ela envolve a descoberta do corpo, dos sentidos e está presente desde o ato gestacional. “Todo o aprendizado que a criança tem passa pela descoberta do corpo e isso não pode ser tolhido”, diz. Para a socióloga e Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Juventude, Identidade, Cultura e Cidadania, Mary Garcia Castro, sexualidade é ter prazer em toques, em estar junto, em descobrir o corpo e gostar dele como ele é, mesmo fora de padrões convencionais.
Na hora de tirar as dúvidas sobre sexo e os aspectos envolvidos pela sexualidade, inclusive a gravidez, o jovem precisa conversar com pessoas de confiança, com as quais se sinta à vontade. Pedagogos assinalam que o ideal seria os pais iniciarem essa conversa na infância, o que facilitaria uma nova abordagem do tema na adolescência. Especialistas apontam que essa temática deveria ser tratada, inclusive, em programas de televisão destinados às crianças.
Mas, na prática, não é isso que ocorre. Os pais, muitas vezes, ficam constrangidos e acreditam que falar de sexo com os filhos é algo que pode levá-los a ter relações precocemente. Essa dificuldade em abordar a sexualidade impede que os jovens tenham uma fonte segura para esclarecer suas dúvidas. De acordo com Erich, os pais, por uma série de aspectos, sejam eles, cognitivos, demanda pessoal ou de valores familiares, ainda sentem dificuldade em tratar o assunto. Em sua opinião, quando isso ocorre é dever dos pais procurar ajuda de um profissional da área. “As famílias de hoje estão mais preparadas, a Internet se tornou uma ferramenta à disposição de todos, a literatura está cada vez mais acessível. O que falta a alguns pais é aceitar que têm limitações”, completa.
Para ele, o diálogo deve iniciar em casa e continuar na escola. “Mas é essencial que a família e a escola falem uma linguagem compatível e que o tema seja abordado com naturalidade”, sustenta. Erich aponta a necessidade de incluir, cada vez mais, nas escolas projetos pedagógicos que contemplem essa temática. “Hoje o que se vê é a falta de preparo dos professores, muitos não são orientados quanto à maneira adequada de falar sobre sexo com os alunos. E pior, alguns não têm sequer a formação pedagógica necessária para abordar a sexualidade e o tema fica aquém do ideal”, ressalta. A socióloga concorda. “A sexualidade, como afetividade e gênero deveriam ser matérias das escolas, por oficinas, no aprender juntos”, frisa.
A Assessora Técnica do Departamento de DST/Aids, Nara Vieira, diz que a falta de qualificação dos professores é uma grande discussão. Os professores admitem que não sabem lidar com esse tema. Mas, para ela, a questão não é estar preparado ou não, e sim tratar o assunto sem que o mesmo seja visto como tabu. “O professor precisa trabalhar o tema com fatos pontuais, incorporá-lo ao cotidiano, ampliar a discussão e ações que ele mesmo pode desenvolver, mas com a participação do jovem”, diz. Ela observa que existe inclusive material educativo disponível para professores e profissionais da saúde (promovido pelos Ministérios da Saúde e Educação) e que as secretarias estaduais estão promovendo formação de professores. “O processo é contínuo e o professor tem de estar aberto para discutir o tema”, observa.
Mary Castro, lamenta o fato de pais e professores não estarem preparados para discutir a temática. Os pais, porque não tiveram e comumente não têm uma sexualidade prazerosa, sadia, e são mais preocupados em evitar filho, Aids e ensinar comportamentos de acordo com os padrões morais. As escolas porque lidam com um tema complexo como sexualidade - que navega entre sensualidade, afetividade, curiosidade com transformações do corpo e exercício de poderes de forma convencional - por aulas, ciências e menos pela prática ou cotidianidade. “A sexualidade poderia ser discutida em aulas de história, matemática, geografia; em situações ocorridas no recreio; em família diante de matérias de revista ou em programas de TV. Uma boa análise crítica dos reality shows dão uma ótima pauta sobre sexualidade: eroticismo x pornografia”, exemplifica.
“Os jovens buscam na sexualidade uma sociabilidade, poder e autonomia que se mesclam com adrenalina, aventura, fama. A repressão faz com que a sexualidade não seja vivida. A família, a escola e os pares, com o auxílio da arte educação podem colaborar para isso. Mas não é o que vem acontecendo”, lamenta a socióloga. Em sua opinião, há boa intenção nas políticas públicas do país, como a distribuição de preservativo, os atuais anúncios sobre preconceitos em relação a pessoas portadoras do HIV/Aids e atenção a adolescentes grávidas. “Mas elas têm um raio de alcance reduzido e são muito formais. Já os parâmetros curriculares, são bem formulados, porém não foram bem aceitos pelos professores. Isso mostra que não basta investir na normatividade. Investimento cultural deve ser parte dos pontos de cultura, das escolas e claro do sistema de saúde (médicos e equipes multidisciplinares)”, aponta.
Segundo o psicólogo e professor Erich Botelho, o jovem sem respaldo e sem orientação acaba adotando um comportamento de onipotência. Para ele, o grande desafio é incluir uma política de educação não só falando de gravidez ou DST/Aids, mas que aborde outros assuntos co-relacionados como: afetividade, relações interpessoais, auto-estima, relacionamentos, valores,  uso de drogas, bullying, violência. Além disso, é preciso criar um local onde o jovem possa ser ouvido, um espaço de troca. “Abrir esse debate em casa, na escola e na sociedade é o que o jovem busca”, conclui.
Carnaval – As meninas são o público-alvo da campanha de prevenção à Aids neste Carnaval de 2010. O Ministério da Saúde vai priorizar o grupo de garotas de treze a 19 anos. O motivo é o crescimento, nos últimos anos, de casos da doença em meninas dessa faixa etária. Com veiculação nas emissoras de televisão e rádio, a campanha vai orientar os jovens sobre as formas de contágio da doença e os cuidados para a prevenção, além da distribuição de camisinhas nos sambódromos e blocos de rua.
Sugestões de fontes:
Mário Volpi - Consultor - Saúde do adolescente - Unicef Brasília
E-mail: 
mvolpi@unicef.org
(61) 3035-1969
Nara Vieira - Assessora Técnica do Departamento de DST e Aids / Ministério da Saúde
Telefones: (61) 3306 7016 / 7010 / 7008 / 9221 2546
E-mail:  
imprensa@aids.gov.br
Site: www.aids.gov.br
Ministério da Saúde – Assessoria de Comunicação
(61) 3315-2005 / 7016
Erich Botelho – Psicólogo e Professor
E-mail: 
erichpsicologo@gmail.com
(61) 9217-7973
José Eduardo Andrade – Secretário-executivo do Conselho Nacional de Juventude - Conjuve
E-mail: 
joseeduardo.andrade@planalto.gov.br
(61) 3411- 3558 / 3592
(61) 9177- 9141
Material de apoio:
Doenças sexualmente transmissíveis na adolescência: Estudo de fatores de riscohttp://www.scielo.br/pdf/rsbmt/v37n3/20296.pdf
Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDShttp://www.onu-brasil.org.br/agencias_unaids.php
Pesquisa sobre Comportamento, Atitudes e Práticas Relacionadas às DST e Aids (PCAP)http://www.aids.gov.br/data/Pages/LUMISE77B47C8ITEMIDE56B57FF739940039DB3112DF74DE47FPTBRIE.htm

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